quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Valongo: escravizados por feirantes em «campo de concentração»


Um juiz de Valongo que em meados deste mês decretou prisão preventiva para dois feirantes, por indícios de escravizarem pelo menos quatro homens fragilizados, considerou que os arguidos criaram às vítimas situações «a roçar» a dos campos de concentração.

No auto de interrogatório dos arguidos, a que Lusa teve agora acesso, o magistrado assinalou que a conduta dos arguidos, mãe e filho, denotou «um profundo desrespeito pela vida e dignidade humanas, a roçar um quase gueto ou situação de campos de refugiados ou de campos de concentração, que a história infelizmente tem vindo a repetir».

A arguida Carminda alegou agir «por caridade» ao recrutar homens que trabalhavam a troco de nada ou quase nada, sujeitos a maus-tratos, coacção e ameaça e privados de documentos de identificação, mas os argumentos não convenceram o juiz.

Entre os que se iludiram com promessas de emprego «a ganhar bem», aceitando trabalhar para os arguidos numa sua propriedade de Campo, Valongo, conta-se Carlos Silva, um homem com problemas psicológicos, institucionalizado num lar de Guimarães em regime semiaberto.

O que ganhou, afinal, foram ameaças («Se fugires daqui e fores à polícia, vamos apanhar-te e dar-te dois tiros»), mas, dias depois, conseguiu remediar a situação, fugindo e contando tudo à polícia.

Foi, apesar de tudo, um calvário bem menos longo que o do imigrante Ivan Tymosho, que foi sujeito a mais de dois anos de trabalho escravo (entre Julho de 2007 e Novembro de 2009), depois de lhe reterem o passaporte, a pretexto de legalizarem a sua situação laboral.

Conforme descrevem os autos, tinham-lhe prometido emprego a troco de alojamento, alimentação e transporte e 500 mensais e deram-lhe 50 euros, faziam-no pernoitar numa garagem, sem condições de habitabilidade e higiene e agrediam-no porque «não se dedicava suficientemente aos trabalhos que lhe eram destinados».

Carlos Craveiro, que dormia ao relento em Vieira do Minho e padecia de epilepsia, foi outro engajado pelo grupo.

Nunca lhe pagaram um tostão e à noite era trancado num quarto com José Vieira, que também padecia de epilepsia, não tinha qualquer retaguarda familiar e sobrevivia de biscates, antes de os arguidos o submeterem a trabalho escravo.

Às autoridades, contou que trabalhava de sol a sol em Valongo, mas também em Espanha, e garantiu que foi vítima de agressões.

O caso de esclavagismo acabou em 13 de Julho passado, quando a Polícia Judiciária passou a pente fino a propriedade de Valongo e encontrou armas não licenciadas, munições e muitos documentos bancários provenientes de uma exploração laboral «já com uma significância quantitativa considerável e geradora de lucros avultados».(Fonte TVI)

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